20 de Julho
Serviço Educativo
11h00
PREÇO: 3€
JARDINS DA QUINTA DAS LÁGRIMAS
DURAÇÃO: cerca de 45 minutos
LOTAÇÃO: limitada
PÚBLICO ALVO: 1.º e 2.º ciclo
Inscrições: faqj2022@gmail.com

Teatro para a infância
“Mito Pedro e Inês”
Produção Camaleão
Repetição do evento de 19 de Julho
Ciclo da Música
21h00
PREÇO: 15€
ANFITEATRO COLINA DE CAMÕES

ESTREIA NACIONAL
“Alla Scala das Míticas Vozes”
Solistas da Accademia Teatro Alla Scala
Trechos de Opera
Fan Zhou, soprano
Mara Gaudenzi, mezzo
Andrea Tanzillo, tenor
Giuseppe De Luca, baritone
Jeong Un Kim, piano
C. W. Gluck
Orfeo ed Euridice: Che farò senza Euridice
Mara Gaudenzi, mezzo
C. W. Gluck
Paride ed Elena: O del mio dolce ardor
Andrea Tanzillo, tenor
G. F. Händel
Alcina: Tornami a vagheggiar
Fan Zhou, soprano
W. A. Mozart
Don Giovanni: Deh, vieni alla finestra
Giuseppe De Luca, baritone
W. A. Mozart
Don Giovanni: Non ti fidar, o misera
Fan Zhou, soprano
Mara Gaudenzi, mezzo
Andrea Tanzillo, tenor
Giuseppe De Luca, baritone
L. Cherubini
Medea:
Solo un pianto
Mara Gaudenzi, mezzo
Del fiero duol
Fan Zhou, soprano
C. Gounod
Faust: Ô sainte médaille… Avant de quitter ces lieux
Giuseppe De Luca, baritone
G. Puccini
Le Villi: Torna ai felici dì
Andrea Tanzillo, tenor
C. W. Gluck
Orphée et Euridice: L’Amour triomphe
Fan Zhou, soprano
Mara Gaudenzi, mezzo
Andrea Tanzillo, tenor
Giuseppe De Luca, baritone
O Teatro Alla Scala é um dos mais prestigiados teatros de ópera da Europa e do Mundo, com uma academia de onde surgem os futuros grandes nomes da ópera, jovens em início de carreira que daqui a uns anos pisarão os maiores palcos internacionais.
ALLA SCALA DAS MÍTICAS VOZES
OU A ANTECIPAÇÃO DE MUITAS E VARIADAS PROMESSAS
(Quinta das Lágrimas, 20 de Julho de 2022)
Mais do que um prometedor recital com trechos de óperas, este concerto traz-nos a oportunidade única de, pela primeira vez em Portugal, descobrir in action a famosa Accademia do Teatro alla Scala e a tradição que esta assimila, com um programa que (de Händel a Puccini, passando por Gluck, Mozart e Gounod) nos expõe a uma galeria inesquecível de personagens míticas (o tema condutor do 13.º Festival das Artes).
Orfeu e Eurídice, Páris e Helena, Medeia
Dois grandes reformadores do dramma per musica, ainda contemporâneos, embora separados por duas gerações ─ refiro-me a Gluck e a Cherubini (o último de resto a assumir a herança do primeiro!) ─, partilham neste programa a responsabilidade de representar o mais rico e diversificado dos filões a que as narrativas míticas expuseram a história da ópera (de Peri a Milhaud, de Monteverdi a Tippett, de Cavalli a Henze, passando por Rameau, Haendel, Mozart, Paisiello, Rossini, Offenbach, Massenet, Taneyev, Pizzetti e Richard Strauss): aquele que devemos à inspiração grega clássica e à literatura que a assimilou e continua a assimilar.
É assim que, com Chistoph Willibald von Gluck (1714-1787), vamos começar e acabar o nosso percurso: ouvindo Orfeu e mergulhando com ele na narrativa por excelência da Música e da Poesia, do Amor e da Morte, do Aniquilamento e da Renovação. Trata-se, logo no início, de aceder à versão de Viena (Orfeo ed Euridice, 1762)… e a uma das mais memoráveis árias de toda a história da ópera (“Che farò senza Euridice”), uma ária breve, de estrutura aparentemente convencional, mas nem por isso menos iluminada por uma adequação exemplar ao texto e à situação dramática (com recursos dinâmicos e alterações de tonalidade na linha vocal que são verdadeiramente inesquecíveis!)… e que será no nosso concerto recriada pelo mezzo de Mara Gaudenzi. Trata-se depois, já no fim do programa, de convocar a versão de Paris (Orphée et Euridice, 1774) e de aceder assim ao ensemble jubilatório “L’amour triomphe!” (reescrito para esta versão) que corresponde ao esperado lieto fine ─ um ensemble que conjuga os solos de Euridice, do Amour e de Orphée (agora um Orfeu tenor)… com uma secção em tutti (aqui confiada ao quarteto de vozes solistas).
Falar da inspiração grega é, no entanto, também invocar um núcleo temático (inesgotável!) concentrado na Guerra de Tróia e nos percursos que a antecederam e que dela emergiram… e é evidentemente neste núcleo que se inscreve, ainda com Gluck, a ópera Paride ed Elena. Logo a seguir ao lamento de Orfeu (com o qual tem evidentes semelhanças estruturais), vamos na verdade ouvir a eloquente declaração de amor de Páris, príncipe de Tróia, a Helena, rainha de Esparta (“bramato oggetto” do seu “ardor”): a ária “O del mio dolce ardor”, um comovente moderato em tonalidade menor com envolventes pianíssimos melismáticos (atenção às palavras “o sospiro”!) que, embora escrito para um castrato (e habitualmente confiado a uma voz feminina), será neste nosso recital assumido pelo tenor Andrea Tanzillo.
No que a Luigi Cherubini (1760-1842) diz respeito, o ciclo narrativo é já o das Argonautas e a ópera a sua indiscutível obra-prima (Medée, 1797), aqui revisitada na sua versão italiana. Teremos dois números muito conhecidos: a hipnótica manifestação de compaixão e de fidelidade assumida pela ama Néris (“Solo un pianto”), que nos trará de novo o mezzo de Mara Gaudenzi, e o torturado monólogo “Del fiero duol”, no qual Medeia, qual Norma, na presença das filhos, hesita em consumar a sua terrível vingança ─ monólogo que há-de expor o soprano de Fan Zhou a desafios de expressão, de tessitura e de coloração do timbre absolutamente únicos (com um discurso de afectos também ele a hesitar entre o legato de um lirismo desencantando e manifestações torrenciais de dor e de desespero).
Alcina
A um outro mundo narrativo – o de Ariosto e o do seu Orlando furioso — pertence seguramente a feiticeira Alcina e a sua ilha de luzes e sombras, de delícias sem fim e de eterna servidão. O que vamos ouvir, também com Fan Zhou, é “Tornami a vagheggiar”, uma das mais amadas árias de Haendel (1685-1759), exemplo inexcedível da prática barroca da ornamentação (e daquilo que esta exige da ars inveniendi do intérprete). É certo que este trecho em da capo provém de uma serenata romana (“O, come chiare e belle”, 1708) significativamente anterior à ópera Alcina (1735)… e que a personagem em cena não é Alcina, mas a sua fiel Morgana… Mas isto importa seguramente muito pouco. Nenhuma das grandes Alcinas (a começar por Joan Sutherland, na famosa gravação de 1962…) resistiu na verdade a apropriar-se (num contexto ou noutro) desta vertiginosa explosão de felicidade e de excitação, de appogiaturas e de trilos…
Don Giovanni
E chegamos à “ópera das ópera”» (Don Giovanni, 1787), recriação genial por Da Ponte e Mozart (1756-1791) do mito do burlador de Sevilha, que, na voz do barítono Giuseppe de Luca, nos vai proporcionar a encantatória serenata do segundo acto (“Deh, vieni, alla finestra”), mas também o primeiro ensemble da noite (“Non ti fidar, o misera”) ─ o assombroso quarteto do primeiro acto, com a sua inimitável fusão de registos (serio e buffo) e a sua (até então sem precedentes) individualizada caracterização musical das personagens (Dona Elvira, Don Giovanni, Don Ottavio, Donna Anna)…
Mitos da (ou na) literatura alemã: Fausto e as Willis
Gounod (1818-1893) e Puccini (1858-1924) ─ um Puccini de 26 anos! ─ serão por fim os mediadores de um outro fecundo filão operático de inspiração mítica: o das narrativas e vozes do Norte (de tradição escandinava, eslava e germânica). Não ouviremos porém as personagens em causa (Fausto e Anna, esta convertida em Willi), mas antes duas das suas vítimas (se não agressores-vítimas, num círculo inextricável de poderes e de resistências):
─ o soldado Valentim, num momento de comoção místico-fraterna ainda anterior ao encontro de Fausto e Margarida [Quem resiste à sedução melódica de “Avant de quitter ces lieux…”, a ária que Gounod escreveu a pedido do barítono Sir Charles Santley para a edição londrina do Faust (1863)… e que hoje será cantada por Giuseppe de Luca?];
─ …e o sedutor-seduzido Roberto (um personagem que na estreia absoluta de Le Villi, em 1884, foi encarnado pelo tenor lírico spinto português António de Andrade!), por sua vez entregue ao remorso e ao desespero a que a morte da abandonada virgem-noiva Anna (pela qual é directamente responsável) insuperavelmente o condena […no não menos irresistível “Torna ai felici di”, um excerto com um contexto discursivo iluminado pelos ideais da Scalpigliatura , mas com inflexões no entanto já verdadeiramente inconfundíveis… e que no nosso concerto nos permitirá ouvir de novo Andrea Tanzillo ].
Sem esquecer que a tarefa dificílima de evocar o interlocutor orquestra vai ser cumprida por Jeong Un Kim, uma celebrada pianista (opera coach no Teatro Regio di Torino)… mas também que está na mão do público abrir a porta dos encores… e concluir assim mais esta noite mágica na colina de Camões.
Coimbra , 18 de Julho de 2022
J M Aroso Linhares